Andréa Margon
Planeta Porto retoma o debate sobre
saúde e segurança do trabalho portuário. Nesta entrevista, Rinaldo Gonçalves
de Almeida, coordenador
Nacional do Trabalho Portuário e Aquaviário (MTE), fala sobre o trabalho
realizado pelo órgão em todo o país e revela que a maior incidência de
acidentes ou lesões laborais está entre os indivíduos com até 30 anos,
resultado da falta de experiência no trabalho. Confira.
Planeta Porto – Como está a questão da saúde e
segurança do trabalho portuário no Brasil?
Rinaldo
Gonçalves de Almeida – De início eu gostaria de
ressaltar que muitas das informações abaixo elencadas foram obtidas com nossos
especialistas em saúde e segurança do trabalho (SST) portuário, uma vez que
nossa coordenação atua tanto com SST quanto com os demais atributos da legislação
trabalhista. Desde a aprovação da Portaria n° 53*, de 17/12/1997, cuja
finalidade foi regular a proteção obrigatória contra acidentes e doenças
profissionais na atividade portuária, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)
vem atuando, por meio das Coordenações Regionais de Inspeção do Trabalho
Portuário e Aquaviário (Coritpas), existentes nos principais portos do país. A
estrutura do MTE possui, ainda, a Coordenação Nacional de Inspeção do Trabalho
Portuário e Aquaviário (Conitpa), localizada no Rio de Janeiro, e uma Divisão
de Fiscalização do Trabalho Portuário e Aquaviário, em Brasília. Nesse período,
temos percebido que a segurança do trabalho portuário tem evoluído,
significativamente, inclusive pela atuação, permanente, dos auditores fiscais
do trabalho (AFTs) e pela conscientização de diversas empresas que operam nos
portos. O momento atual, todavia, é preocupante. A expansão da economia
nacional vem, geralmente, acompanhada de pressão por cumprimento de prazos,
excessos de jornada e forte contratação de empresas terceirizadas. Essas
situações aumentam a chance de acidentes do trabalho, ainda mais em uma
atividade como a portuária.
* A Portaria n° 53/1997 aprovou o texto da Norma Regulamentadora
NR-29, relativa à segurança e saúde no trabalho portuário. O documento pode ser
consultado na área LEGISLAÇÃO do portal do MTE na internet
(www.mte.gov.br/legislacao)
Planeta Porto – Quais medidas, efetivas, estão
dando resultado para reverter um quadro tão grave?
Rinaldo Gonçalves de
Almeida – O crescimento econômico brasileiro gera incremento, tanto da importação
quanto da exportação, de produtos que frequentemente são movimentados nos
portos brasileiros. Dados recentes da Comissão Econômica para a América Latina
e o Caribe (Cepal) mostram que o Brasil obteve o primeiro lugar na movimentação
de contêineres, em 2011, na referida região. Este crescimento, como já foi
dito, aumenta o risco de acidentes de trabalho nos portos. Nossas Coritpas têm
desempenhado um papel fundamental na busca pelo cumprimento da legislação de
proteção à saúde e à segurança no trabalho portuário. Nas inspeções realizadas
pelos auditores fiscais do trabalho, a empresa pode ser notificada a se adequar
às normas de segurança e saúde, ou pode ser autuada e multada em relação aos
descumprimentos.
Em relação aos acidentes de trabalho, vale observar que
investigações são realizadas para constatações das falhas e correções de
procedimentos. Os relatórios elaborados pelos AFTs têm resultado em
indenizações, na Justiça do Trabalho, para os acidentados e suas famílias. O
Ministério Público do Trabalho, por sua vez, tem aberto inquéritos civis e
ações civis públicas com base nesses relatórios, bem como as Procuradorias
Federais passaram a ajuizar ações regressivas, em face das empresas que não
observam as normativas de proteção ao trabalho. Já o Ministério da Previdência
Social implementou a alíquota do Fator Acidentário Previdenciário, para as
empresas onde o número de acidentes sofreu elevação. Essas medidas têm
resultado em um maior investimento, por parte das empresas, na área de
segurança e saúde do trabalho portuário.
A nossa atuação, em Segurança e Saúde no Trabalho (SST), ocorre de
maneira integrada. Fiscalizando-se, simultaneamente, excessos de jornada,
terceirizações indevidas e outras irregularidades que causam impacto direto na
questão. As situações de grave e iminente risco que possam comprometer a
integridade física do trabalhador portuário são interditadas ou embargadas, até
que sejam regularizadas.
Planeta Porto –
Existem números que possam comprovar a incidência de acidentes e
afastamentos por doenças laborais no país? Quais são esses números?
Rinaldo Gonçalves de
Almeida – A Previdência realizou um estudo global* e concluiu que o cenário
de acidentalidade no Brasil aponta números muito preocupantes: em média são 43
trabalhadores/dia que não mais retornam ao trabalho devido à invalidez ou à morte
(dados de 2009).
*www.inss.gov.br/arquivos/office/3_120425-115428-524.pdf
Planeta Porto – O que a ala dos empresários tem
feito para reverter o quadro? E os sindicatos representativos dos
trabalhadores?
Rinaldo Gonçalves de
Almeida – Diversos empregadores estão mais conscientes de suas responsabilidades
sociais e trabalhistas, procurando modernizar as operações portuárias. Essa
mudança de atitude contribui para a elevação da produtividade e a redução dos
acidentes de trabalho nas operações. Já os sindicatos sempre demandam a
fiscalização do trabalho, quando ocorrem desequilíbrios na relação laboral
entre patrões e trabalhadores, denunciando situações de risco ou alguma
violação à norma legal. Ambos – empresários e sindicatos – colaboram na
Comissão Permanente Nacional Portuária (CPNP), órgão tripartite coordenado pela
Inspeção do Trabalho que se encontra, periodicamente, para acompanhar e
aperfeiçoar a Norma Regulamentadora N° 29 (NR-29), que trata da proteção do
trabalho portuário. A Comissão visita a cada ano diversos portos do país,
realizando encontros com trabalhadores e empresários locais e apresentando
relatórios, que são enviados à fiscalização para as medidas corretivas.
Planeta Porto – Em qual porto/terminal há maior incidência de acidentes e doenças
laborais?
Rinaldo Gonçalves de
Almeida – Cada porto tem suas características específicas, movimentando
cargas que dependem das indústrias locais. Por exemplo: Manaus movimenta
produtos eletrônicos, enquanto Pecém, no Ceará, movimenta frutas e mais
recentemente produtos siderúrgicos. Portanto, não é facil fazer uma comparação,
mas de forma geral, quanto maior a movimentação de cargas no porto, maior a
probabilidade ou risco de acidentes. A NR-29 procura reduzir esses riscos nas
operações portuárias.
Planeta Porto – Qual a faixa etária mais afetada?
Rinaldo Gonçalves de
Almeida – De maneira geral, os acidentes têm afetado os trabalhadores com
menos de 30 anos, ou seja, pessoas com menos experiência.
Planeta Porto – Como se dá a fiscalização por parte do
Governo?
Rinaldo Gonçalves de Almeida – Em todos os estados, com portos de grande atividade, existe uma
Coordenação Regional de Inspeção do Trabalho Portuário e Aquaviário (Coritpa),
vinculada à respectiva Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE),
pela qual são realizadas fiscalizações rotineiras ou por denúncia dos
trabalhadores, dos sindicatos ou para atender a solicitações do Ministério
Público do Trabalho (nossa sistemática de fiscalização já foi abordada acima).
A atuação na
prevenção de acidentes do trabalho portuário é reforçada no MTE pela atuação do
Grupo de Fiscalização Móvel Nacional (GMN). Sempre que o grupo local,
representado pela Coritpa, identifica alguma situação de descumprimento em que
sua atuação não é capaz de coibir as irregularidades, o grupo local pede apoio
à Coordenação Nacional de Inspeção do Trabalho Portuário e Aquaviário (Conitpa),
que organiza e envia uma equipe de auditores fiscais de outros estados. Esse
grupo permanece no porto em questão durante, pelo menos, uma semana. O mesmo
procedimento ocorre quando a CPTP identifica, em seus encontros periódicos,
algum porto do país que demanda uma atuação de maior impacto. O fato do Grupo
Especial de Fiscalização Móvel ser composto por AFTs de outros estados favorece
a percepção, por parte dos empregadores, de que nossa atuação possui um caráter
institucional e de garantia da legislação vigente. O funcionamento do GMN foi
identificado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 2010, como
uma boa prática da inspeção do trabalho no Brasil, sendo realizada uma
publicação sobre o tema, por meio de acordo de cooperação com países como a
Noruega, a China, a Índia e a Rússia. Através do GMN buscamos harmonizar os
procedimentos de fiscalização das Coritpas, levando nossos especialistas mais
experientes aos estados com mais dificuldades de fiscalização. O Grupo Móvel
funciona, ainda, como ferramenta para garantir a sustentabilidade da inspeção
do trabalho nos portos. Isso porque vários de nossos especialistas se aproximam
da aposentadoria, enquanto outros auditores fiscais foram recentemente
admitidos na carreira, sem qualquer experiência na área portuária. As equipes
do GMN são, geralmente, compostas por novos e antigos AFTs, deixando pelo menos
três turnos dedicados ao treinamento prático e teórico. Deve-se ressaltar que
nosso Grupo Móvel realiza, em média, duas fiscalizações por mês, que cobrem não
só a fiscalização portuária, mas também a da atividade aquaviaria, que engloba
setores fortemente aquecidos, tais como a produção de petróleo e gás offshore,
a pesca, a marinha mercante e a construção naval, entre outros.
Planeta Porto – Considerações
Rinaldo Gonçalves de
Almeida – A redução dos acidentes de trabalho deve ser um esforço conjunto
de toda a sociedade. Os esforços do Ministério do Trabalho e Emprego têm
ocorrido de maneira coordenada com outros órgãos de governo. Recente análise de
acidente fatal no Porto do Rio de Janeiro elaborada pelo MTE, por exemplo, foi
enviada ao MPT, gerando uma ação civil pública contra o empregador. Como o
acidente teve impacto ambiental, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama)
se envolveu, assim como a Polícia Federal, que realizou entrevistas e
diligências com nossos AFTs visando levantar informações e análises, para
subsidiar o inquérito.
As denúncias de irregularidades sobre o tema podem ser feitas na Conitpa
pelo telefone (21) 2263-1438 ou nas Coordenações Regionais de Trabalho
Portuário e Aquaviario, espalhadas pelos principais portos do Brasil.
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