terça-feira, 14 de agosto de 2012

Falta de experiência é um dos vilões para saúde e segurança nos portos


Andréa Margon

Planeta Porto retoma o debate sobre saúde e segurança do trabalho portuário. Nesta entrevista, Rinaldo Gonçalves de Almeida, coordenador Nacional do Trabalho Portuário e Aquaviário (MTE), fala sobre o trabalho realizado pelo órgão em todo o país e revela que a maior incidência de acidentes ou lesões laborais está entre os indivíduos com até 30 anos, resultado da falta de experiência no trabalho. Confira.


Planeta Porto – Como está a questão da saúde e segurança do trabalho portuário no Brasil?

Rinaldo Gonçalves de Almeida – De início eu gostaria de ressaltar que muitas das informações abaixo elencadas foram obtidas com nossos especialistas em saúde e segurança do trabalho (SST) portuário, uma vez que nossa coordenação atua tanto com SST quanto com os demais atributos da legislação trabalhista. Desde a aprovação da Portaria n° 53*, de 17/12/1997, cuja finalidade foi regular a proteção obrigatória contra acidentes e doenças profissionais na atividade portuária, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) vem atuando, por meio das Coordenações Regionais de Inspeção do Trabalho Portuário e Aquaviário (Coritpas), existentes nos principais portos do país. A estrutura do MTE possui, ainda, a Coordenação Nacional de Inspeção do Trabalho Portuário e Aquaviário (Conitpa), localizada no Rio de Janeiro, e uma Divisão de Fiscalização do Trabalho Portuário e Aquaviário, em Brasília. Nesse período, temos percebido que a segurança do trabalho portuário tem evoluído, significativamente, inclusive pela atuação, permanente, dos auditores fiscais do trabalho (AFTs) e pela conscientização de diversas empresas que operam nos portos. O momento atual, todavia, é preocupante. A expansão da economia nacional vem, geralmente, acompanhada de pressão por cumprimento de prazos, excessos de jornada e forte contratação de empresas terceirizadas. Essas situações aumentam a chance de acidentes do trabalho, ainda mais em uma atividade como a portuária.

* A Portaria n° 53/1997 aprovou o texto da Norma Regulamentadora NR-29, relativa à segurança e saúde no trabalho portuário. O documento pode ser consultado na área LEGISLAÇÃO do portal do MTE na internet (www.mte.gov.br/legislacao)

Planeta Porto Quais medidas, efetivas, estão dando resultado para reverter um quadro tão grave?

Rinaldo Gonçalves de Almeida O crescimento econômico brasileiro gera incremento, tanto da importação quanto da exportação, de produtos que frequentemente são movimentados nos portos brasileiros. Dados recentes da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) mostram que o Brasil obteve o primeiro lugar na movimentação de contêineres, em 2011, na referida região. Este crescimento, como já foi dito, aumenta o risco de acidentes de trabalho nos portos. Nossas Coritpas têm desempenhado um papel fundamental na busca pelo cumprimento da legislação de proteção à saúde e à segurança no trabalho portuário. Nas inspeções realizadas pelos auditores fiscais do trabalho, a empresa pode ser notificada a se adequar às normas de segurança e saúde, ou pode ser autuada e multada em relação aos descumprimentos.

Em relação aos acidentes de trabalho, vale observar que investigações são realizadas para constatações das falhas e correções de procedimentos. Os relatórios elaborados pelos AFTs têm resultado em indenizações, na Justiça do Trabalho, para os acidentados e suas famílias. O Ministério Público do Trabalho, por sua vez, tem aberto inquéritos civis e ações civis públicas com base nesses relatórios, bem como as Procuradorias Federais passaram a ajuizar ações regressivas, em face das empresas que não observam as normativas de proteção ao trabalho. Já o Ministério da Previdência Social implementou a alíquota do Fator Acidentário Previdenciário, para as empresas onde o número de acidentes sofreu elevação. Essas medidas têm resultado em um maior investimento, por parte das empresas, na área de segurança e saúde do trabalho portuário.

A nossa atuação, em Segurança e Saúde no Trabalho (SST), ocorre de maneira integrada. Fiscalizando-se, simultaneamente, excessos de jornada, terceirizações indevidas e outras irregularidades que causam impacto direto na questão. As situações de grave e iminente risco que possam comprometer a integridade física do trabalhador portuário são interditadas ou embargadas, até que sejam regularizadas.

Planeta Porto Existem números que possam comprovar a incidência de acidentes e afastamentos por doenças laborais no país? Quais são esses números?

Rinaldo Gonçalves de Almeida A Previdência realizou um estudo global* e concluiu que o cenário de acidentalidade no Brasil aponta números muito preocupantes: em média são 43 trabalhadores/dia que não mais retornam ao trabalho devido à invalidez ou à morte (dados de 2009).
*www.inss.gov.br/arquivos/office/3_120425-115428-524.pdf


      Planeta Porto O que a ala dos empresários tem feito para reverter o quadro? E os sindicatos representativos dos trabalhadores?

Rinaldo Gonçalves de Almeida Diversos empregadores estão mais conscientes de suas responsabilidades sociais e trabalhistas, procurando modernizar as operações portuárias. Essa mudança de atitude contribui para a elevação da produtividade e a redução dos acidentes de trabalho nas operações. Já os sindicatos sempre demandam a fiscalização do trabalho, quando ocorrem desequilíbrios na relação laboral entre patrões e trabalhadores, denunciando situações de risco ou alguma violação à norma legal. Ambos – empresários e sindicatos – colaboram na Comissão Permanente Nacional Portuária (CPNP), órgão tripartite coordenado pela Inspeção do Trabalho que se encontra, periodicamente, para acompanhar e aperfeiçoar a Norma Regulamentadora N° 29 (NR-29), que trata da proteção do trabalho portuário. A Comissão visita a cada ano diversos portos do país, realizando encontros com trabalhadores e empresários locais e apresentando relatórios, que são enviados à fiscalização para as medidas corretivas.

Planeta Porto – Em qual porto/terminal há maior incidência de acidentes e doenças laborais?

Rinaldo Gonçalves de Almeida Cada porto tem suas características específicas, movimentando cargas que dependem das indústrias locais. Por exemplo: Manaus movimenta produtos eletrônicos, enquanto Pecém, no Ceará, movimenta frutas e mais recentemente produtos siderúrgicos. Portanto, não é facil fazer uma comparação, mas de forma geral, quanto maior a movimentação de cargas no porto, maior a probabilidade ou risco de acidentes. A NR-29 procura reduzir esses riscos nas operações portuárias.

Planeta Porto – Qual a faixa etária mais afetada?

Rinaldo Gonçalves de Almeida De maneira geral, os acidentes têm afetado os trabalhadores com menos de 30 anos, ou seja, pessoas com menos experiência.

Planeta Porto – Como se dá a fiscalização por parte do Governo?

Rinaldo Gonçalves de Almeida Em todos os estados, com portos de grande atividade, existe uma Coordenação Regional de Inspeção do Trabalho Portuário e Aquaviário (Coritpa), vinculada à respectiva Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE), pela qual são realizadas fiscalizações rotineiras ou por denúncia dos trabalhadores, dos sindicatos ou para atender a solicitações do Ministério Público do Trabalho (nossa sistemática de fiscalização já foi abordada acima).

A atuação na prevenção de acidentes do trabalho portuário é reforçada no MTE pela atuação do Grupo de Fiscalização Móvel Nacional (GMN). Sempre que o grupo local, representado pela Coritpa, identifica alguma situação de descumprimento em que sua atuação não é capaz de coibir as irregularidades, o grupo local pede apoio à Coordenação Nacional de Inspeção do Trabalho Portuário e Aquaviário (Conitpa), que organiza e envia uma equipe de auditores fiscais de outros estados. Esse grupo permanece no porto em questão durante, pelo menos, uma semana. O mesmo procedimento ocorre quando a CPTP identifica, em seus encontros periódicos, algum porto do país que demanda uma atuação de maior impacto. O fato do Grupo Especial de Fiscalização Móvel ser composto por AFTs de outros estados favorece a percepção, por parte dos empregadores, de que nossa atuação possui um caráter institucional e de garantia da legislação vigente. O funcionamento do GMN foi identificado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 2010, como uma boa prática da inspeção do trabalho no Brasil, sendo realizada uma publicação sobre o tema, por meio de acordo de cooperação com países como a Noruega, a China, a Índia e a Rússia. Através do GMN buscamos harmonizar os procedimentos de fiscalização das Coritpas, levando nossos especialistas mais experientes aos estados com mais dificuldades de fiscalização. O Grupo Móvel funciona, ainda, como ferramenta para garantir a sustentabilidade da inspeção do trabalho nos portos. Isso porque vários de nossos especialistas se aproximam da aposentadoria, enquanto outros auditores fiscais foram recentemente admitidos na carreira, sem qualquer experiência na área portuária. As equipes do GMN são, geralmente, compostas por novos e antigos AFTs, deixando pelo menos três turnos dedicados ao treinamento prático e teórico. Deve-se ressaltar que nosso Grupo Móvel realiza, em média, duas fiscalizações por mês, que cobrem não só a fiscalização portuária, mas também a da atividade aquaviaria, que engloba setores fortemente aquecidos, tais como a produção de petróleo e gás offshore, a pesca, a marinha mercante e a construção naval, entre outros.

Planeta Porto – Considerações

Rinaldo Gonçalves de Almeida A redução dos acidentes de trabalho deve ser um esforço conjunto de toda a sociedade. Os esforços do Ministério do Trabalho e Emprego têm ocorrido de maneira coordenada com outros órgãos de governo. Recente análise de acidente fatal no Porto do Rio de Janeiro elaborada pelo MTE, por exemplo, foi enviada ao MPT, gerando uma ação civil pública contra o empregador. Como o acidente teve impacto ambiental, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) se envolveu, assim como a Polícia Federal, que realizou entrevistas e diligências com nossos AFTs visando levantar informações e análises, para subsidiar o inquérito.

As denúncias de irregularidades sobre o tema podem ser feitas na Conitpa pelo telefone (21) 2263-1438 ou nas Coordenações Regionais de Trabalho Portuário e Aquaviario, espalhadas pelos principais portos do Brasil.

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